A
anorexia nervosa é um tipo de transtorno alimentar caracterizado pela recusa
deliberada do indivíduo em se alimentar, pelo medo mórbido de engordar além de
uma profunda distorção da imagem corporal. O indivíduo anoréxico preocupa-se
excessivamente com a alimentação e com um ganho de peso irreal, que lhe causa
sofrimento subjetivo intenso. Muitos deles desenvolvem estratégias e mecanismos
para perder peso e que incluem uso de laxantes e diuréticos, vômito
auto-induzido e excesso de exercícios físicos. Todavia, a perda de peso na
maioria das vezes não alivia sua insistência desmedida em continuar
emagrecendo, tampouco sua insatisfação com a própria imagem.
Os critérios adotados para
classificação da anorexia nervosa são determinados pelo DSM-IV e pela CID-10 e
as comparações estão listadas no quadro abaixo.
Quadro. Comparações dos critérios
diagnósticos do DSM-IV e da CID-10 para anorexia nervosa.
Pacientes com anorexia nervosa do
subtipo purgativo, ou seja, que apresentam alguma prática de purgação (vômitos,
diuréticos e laxantes), são mais impulsivas e apresentam aspectos de
personalidade diferentes de pacientes que usam apenas práticas restritivas e
são mais perfeccionistas e obsessivas.
Manifestações
Comportamentais
Pacientes anoréxicas quase sempre
chegam ao tratamento conduzidas pelos pais, contra sua vontade: para elas,, sua
doença é solução e não problema, é uma prova de sucesso em meio a tantas
incertezas sobre suas capacidades. Sabem de forma absoluta como controlar o
apetite (principalmente aquelas com anorexia restritiva) e temem qualquer
medida que ameace esse controle, recusando-se tenazmente a aceitar as primeiras
recomendações.
A ideia de evitar alimentos
calóricos é sobrevalorizada e domina os pensamentos e atitudes no dia-a-dia.
Podem dissimular sua negativa com ares de submissão, mas certamente, no início
do tratamento, continuarão seguindo suas próprias ideias e crenças sobre a
alimentação.
Dentre os aspectos mais evidentes,
destacam-se o negativismo, a irritabilidade e a distorção da imagem corporal
acompanhada de medo irracional de engordar. Essa preocupação pode estar
localizada mais frequentemente nas seguintes partes do corpo: nádegas, coxas,
braços, abdome e rosto; além disso, as pacientes veem-se “redondas”,
“nojentas”, com “pelancas de gorduras”.
Estabelecem pesos “ideais” muito
abaixo dos padrões saudáveis e buscam alcançá-los de forma agressiva consigo
mesma, ou, muitas vezes, envolvendo seus familiares. Seus “rituais” alimentares
caracterizam-se por:
●
só aceita comer sozinha e obriga familiares a esperarem-na sair de casa para
fazerem suas refeições (por temor de ser contaminada ou engordar se estiver
presente);
●
exigências de horários de refeições que precisam ser cumpridos à risca;
●
picar alimentos em pequenos pedaços e espalhá-los no prato, como forma de disfarçar
a pequena quantidade, tornando-se irascível se suspeita que algum ingrediente
“proibido” foi adicionado no preparo deles ou lhe foi acrescentado ao prato
servido.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgXrr3WoTAFM7hE9fG6PkIIvQQMSmvfCCx00CpCRb0M573adAjZDG0lSCI2zg8hnrMZFZjHBst9YJtdBmu9r_RFVy6zLdGd0eC7o4-TWvJvzRQfrShQJ3XSZy7lC5GMF8O3YNgH6qUL8Nu7/s200/anorexia+vomitando.jpg)
Em geral, as pacientes vestem roupas
largas e superpostas para disfarçar sua magreza. O estado de desnutrição grave
determina mudanças físicas: a pele e os cabelos têm aparência ressecada e sem
vida; uma fina camada de penugem pode recobrir todo o corpo (lanugem); há casos
em que aparecem petéquias (pequenos pontos de sangramento sob a pele) na pele,
edemas de membros e as palmas das mãos adquirem um tom amarelado resultante da
hipercarotenemia (nível elevado de caroteno no sangue).
Quando os pacientes utilizam métodos
purgativos, podem apresentar erosão do esmalte dentário e lesões (calosidades)
no dorso das mãos, causadas pelo atrito dos dentes e pela prática de vômitos.
Bradicardia, hipotensão, constipação intestinal e hipotermia são sinais muito frequentes. Amenorreia representa outro sinal clínico, ainda discutível como
critério diagnóstico e nem sempre decorrente da perda significativa de peso,
podendo iniciar-se antes dessa perda. Sua duração prolongada determina riscos
de osteopenia (redução da densidade mineral dos ossos) e osteoporose. Quando o
quadro instala-se antes da puberdade, pode retardar o desenvolvimento de
características sexuais secundárias e interferir no crescimento ósseo,
resultando em baixa estatura.
Tratamento Nutricional
As metas do tratamento nutricional
na anorexia nervosa (AN) envolvem o restabelecimento do peso, normalização do
padrão alimentar, da percepção de fome e saciedade e correção das sequelas
biológicas e psicológicas da desnutrição.
O ganho de peso deve ser controlado.
É recomendado um ganho de 900 g a 1,3 kg/semana para pacientes de enfermaria e
250 g a 450 g/semana para pacientes de ambulatório. Todavia, alguns autores
verificaram que um ganho de peso de 720g/4 dias era mais seguro, pois não
causava a síndrome da realimentação.
Esta síndrome é caracterizada por anormalidades dos fluidos e eletrólitos (principalmente do fósforo) e pode levar a complicações cardiológicas, neurológicas, hematológicas e até à morte súbita. Portanto, a alimentação deve ser cautelosa, com monitoração dos eletrólitos.
O consumo energético recomendado é de 30 a 40 kcal/kg por dia, podendo chegar até 70 a 100 kcal/kg por dia com a progressão do tratamento. O valor energético total da dieta não deve ser abaixo de 1.200 kcal/dia. Este aumento gradual pode ajudar a reduzir a ansiedade quanto ao ganho de peso, e permite que o trato gastrointestinal se adapte à realimentação. A proporção de macronutrientes deve ser igual às recomendações para populações saudáveis.
Alguns autores encontraram
deficiências de zinco e ácido fólico em adolescentes com anorexia nervosa que
não se reverteram após o tratamento, de tal forma que os autores recomendaram a
suplementação destes nutrientes. Em outro estudo, relatou-se que as
consequências da deficiência de zinco são muito semelhantes à anorexia nervosa,
e que a suplementação com zinco promove maior ganho de peso e redução da
ansiedade e depressão. Em relação ao cálcio, alguns estudos comprovaram os
efeitos positivos da suplementação de 1.000 a 2.000 mg/dia na redução da
osteopenia (complicação comum decorrente da anorexia nervosa).
Em alguns pacientes, é extremamente difícil atingir as recomendações nutricionais apenas pela via oral. Nessas ocasiões, a alimentação nasogástrica pode ser recomendada ao invés da intravenosa, que só deve ser utilizada em situações nas quais há risco de vida. A alimentação nasogástrica pode acarretar, contudo, retenção de fluidos, arritmia e falência cardíaca. Apesar de a maioria dos autores não recomendarem a nutrição enteral ou parenteral, outros autores relataram que o uso da sonda nasogástrica noturna pode trazer ganho de peso mais rápido do que somente com a alimentação oral.
O nutricionista participa de todo processo de planejamento das refeições, ajudando o paciente a consumir uma dieta adequada e monitorando o balanço energético, assim como o ganho de peso. Deve-se ajudar o paciente a normalizar o seu padrão alimentar e aprender que a mudança de comportamento deve sempre envolver planejamento e o contato com os alimentos.
As informações contidas
neste blog, não devem ser substituídas por atendimento presencial aos
profissionais da área de saúde, como médicos, nutricionistas, psicólogos,
educadores físicos e etc. e sim, utilizadas única e exclusivamente, para seu
conhecimento.
Referências
Bibliográficas:
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bulimia nervosa – abordagem cognitivo-construtiva de psicoterapia. Rev
Psisquiatr Clin 2004; v.31, n.4: p.177-183.
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Manifestações Clínicas, Curso e Prognóstico. In Claudino, AM; Zanella, MT.
Guias de medicina ambulatorial e hospitalar UNIFESP/ Escola Paulista de
Medicina - Transtornos Alimentares e Obesidade. 1 ed. Baureri: Manole. 2005.
p.39-48.
Latterza, AR; Dunker, KLL; Scagliusi, FB;
Kemen, E. Tratamento Nutricional nos Transtornos Alimentares. Rev Psiquiatr
Clin 2004; v.31, n.4: p.173-176.
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