quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

Açúcar e Compulsão Alimentar


 
O açúcar não é cocaína! É verdade que o cérebro pode responder a essa substância, assim como à gordura, de forma semelhante a drogas, no sentido de ativar seus centros de prazer e recompensa. Mas não dá para comparar o que muitos chamam de ‘vício em comida’ com o vício em drogas. Até porque nenhum alimento é capaz de gerar uma crise de abstinência, por exemplo. Sem contar que o açúcar pode fazer parte de uma vida equilibrada, em que se come de tudo de maneira saudável. E o mesmo não dá para dizer da cocaína. Conclusão: não perpetue a comparação de qualquer alimento com drogas.

O que é transtorno de compulsão alimentar?


O transtorno da compulsão alimentar (TCA) é uma entidade clínica da psiquiatria, bem definida e muito estudada. Ele é caracterizado pela ingestão descontrolada de quantidades grandes de alimentos, nos chamados episódios de compulsão alimentar, conhecidos pela sigla ECA ou binge eating, em inglês. Esses episódios são repetitivos e sem comportamentos compensatórios inadequados.

Qual seria a relação entre TCA, carboidratos simples e vício em comida?

 Habitualmente os alimentos presentes nos episódios de compulsão alimentar são, de fato, muito palatáveis ou ultraprocessados. Eles costumam ter teores elevados de sal, gorduras e açúcares. Acabam sendo consumidos por uma procura ativa de quem os ingere. É quando a pessoa compra vários pacotes de uma guloseima qualquer por causa de uma promoção ou por preços convidativos.

Vários pacientes relatam que não conseguem se segurar e têm que sair de casa, às vezes no meio da noite, só para comprar algum desses alimentos, ao menos no início do quadro. Depois, passam a ter estoques maiores, para evitar esse tipo contratempo.

Podemos falar em vício por doces?

Algumas das vias neurológicas envolvidas na obtenção de prazer são comuns aos alimentos, ao sexo e aos efeitos de algumas drogas. Alimentos ricos em açúcar, sal e gordura ativam essas vias. E foi a partir desse aspecto que alguns cientistas passaram a acreditar que o conceito de ‘vício em comida’  fosse adequado. O tema começou então a ser pesquisado até os dias de hoje. No entanto, há algumas questões que fazem com que esse conceito não seja aceito pela totalidade  — aliás,nem mesmo pela maioria da comunidade científica. O assunto sempre gera polêmicas nas publicações acadêmicas e discussões acaloradas em congressos. 

Mas, se você refletir um pouco sobre a ideia de que alguém possa desenvolver uma adição a uma condição indispensável à sobrevida individual e da espécie, irá ter um vislumbre: não dá para você criar uma dependência de ar; você já nasce com ela. De modo similar, ingerir comidas com alto teor de açúcar, sal e gordura teve um papel evolutivo importante no passado, que hoje não serve mais. Mas nossa carga genética demora muitas gerações para mudar. Digamos que parar de gostar desses alimentos exige um alto esforço individual e parar de consumi-los tem um custo emocional e até financeiro maior. Daí a assumir que essa dificuldade é necessariamente um vício pode não ser tão simples.


 

Mas o que dizem por aí sobre o açúcar ser um vilão, especialmente para quem tem TCA?

Todos têm o direito a achar o que quiserem sobre qualquer tema. Mas, se você desejar uma opinião embasada sobre o conserto do seu carro e não for especializado na área, sugiro que procure seu mecânico de confiança, ao menos até você acabar de fazer o seu curso de mecânica. Do mesmo modo, se você deseja consertar alguma coisa de sua saúde, procure por um bom profissional da área e que seja de confiança. Em resumo, não acredite no que escutar de influenciadores sobre problemas graves, como é uma compulsão alimentar. Procure um profissional de saúde.

Há muitas pessoas por aí que podem ser bem intencionadas, mas pouco embasadas, dando conselhos que têm cara de bons. Só que eles não apenas não são verdades aceitas pela ciência, como podem fazer mal. E, claro, há também as notícias mal intencionadas, mas elas não são o nosso foco nesse caso.

É tudo mais complexo. O fato de você comer muito chocolate porque gosta ou repetir determinado doce não é suficiente para definir o TCA. Além disso, a pessoa pode desenvolver uma compulsão de fato por alimentos que não são necessariamente doces. O açúcar é gostoso, pode trazer prazer e bem-estar, longe de ser um vício. E é bom ressaltar que pacientes portadores de obesidade podem consumi-lo, desde que com moderação. O que deve ser evitado, sempre, são os excessos.

 

As informações contidas neste blog, não devem ser substituídas por atendimento presencial aos profissionais da área de saúde, como médicos, nutricionistas, psicólogos, educadores físicos e etc. e sim, utilizadas única e exclusivamente, para seu conhecimento.

Referências Bibliográficas:

Cercato, C; Segal, A; Beyruti, M. Cinco esclarecimentos sobre açúcar e compulsão alimentar. Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica – ABESO. Disponível em: www.abeso.org.br Acessado em: 10/02/2022.


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