domingo, 26 de fevereiro de 2017

Glúten e Açúcar



A ocorrência de doenças cerebrais está aumentando. Atualmente cerca de 20% dos adultos sofrem de algum transtorno mental, e este número está crescendo. A depressão é a principal causa de incapacidade em todo o mundo. A ansiedade afeta milhares de pessoas. Segundo a Alz.Org / Alzheimers Association, o mal de Alzheimer mata um em cada três idosos, e mata mais do que câncer de mama e próstata juntos.  Um estudo de 2013 mostrou que em 30 anos as mortes causadas por doença cerebral aumentaram 66% nos homens e 92% nas mulheres!

Inflamação

E o que adoece a nossa máquina de pensar? Inflamação é o fator comum nas doenças cerebrais. Há um novo campo de estudo, conhecido como “modelo de citocina na função cognitiva”, que procura entender como a inflamação crônica de baixa intensidade impacta a saúde e o funcionamento do cérebro.  Onde há inflamação existem citocinas pró-inflamatórias. Elas atuam negativamente na resposta imunológica do corpo e nos mecanismos moleculares ligados à aprendizagem, memória e capacidade mental. 

Segundo cérebro

Há muitas maneiras diferentes do cérebro ficar inflamado, e um dos principais mecanismos nem começa diretamente na massa cerebral, e sim no que chamamos de "segundo cérebro": o intestino. A comida tem um papel importante nos níveis de inflamação. Existem diversos alimentos que contribuem para produzir um estado inflamatório no intestino (e no cérebro), como açúcar e gordura trans, porém o maior culpado pode ser o glúten.

Doenças cerebrais

O neurologista David Perlmutter, em seu fantástico livro Grain Brain (aqui traduzido para Cérebro de Farinha), lista diversas doenças do cérebro ligadas ao glúten, cereais refinados e açúcar: dor de cabeça crônica, enxaqueca, insônia, ansiedade, stress, depressão, fog mental, falta de foco e concentração, epilepsia, desordens do movimento (ataxia), esquizofrenia, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), demência, Alzheimer, Parkinson, esclerose múltipla, esclerose lateral amiotrófica (ELA), autismo, fadiga crônica e muitas outras.

Doença celíaca

Embora apenas 1% da população tenha diagnóstico de doença celíaca, é muito provável que este problema esteja vastamente subdiagnosticado, passando despercebido nos consultórios. Na verdade, apenas 10% das pessoas com doença celíaca apresentam sintomas intestinais evidentes (dor, distensão abdominal, gases, diarreia, constipação, etc.). Pesquisas sugerem que a doença celíaca pode apresentar-se estritamente como um problema neurológico e/ou psiquiátrico. A estimativa é de que 1 em cada 20 pessoas vivam com a sensibilidade não-celíaca ao glúten e nem desconfiam disso.

Glúten e açúcar

Glúten, açúcar e carboidratos refinados causam inflamação persistente, sistêmica, de baixa intensidade. Esta inflamação está diretamente implicada em quase todas as doenças crônicas, e as condições que afetam o cérebro não são exceção. Ao contrário de outros órgãos o cérebro não tem fibras nervosas para a dor, ele sofre em silêncio. Quando temos dor de cabeça quem reclama são os vasos sanguíneos. As outras doenças mentais evoluem de forma quieta, despercebidas, ao longo de décadas. 



Intestino e cérebro permeáveis

O glúten aumenta os níveis de zonulina, uma proteína que altera e inflama o cólon, levando à síndrome do intestino permeável. Esta permeabilidade aumentada do intestino permite que as proteínas do alimento não digerido e toxinas bacterianas passem para a corrente sanguínea, ativando uma resposta inflamatória e imunológica no corpo. Níveis elevados de zonulina no intestino têm sido associados a níveis elevados de zonulina no cérebro. Tradução: um intestino permeável pode levar a um cérebro permeável.

Gatilho

Uma vez rompida a barreira hematoencefálica (sangue-cérebro), o sistema imunológico do cérebro (células gliais) pode ser ativado. Células gliais (cerca de 50% da massa cerebral) vão causar uma reação inflamatória em todo o órgão. Ou seja, o glúten é um tipo de gatilho que permite que partículas de alimentos e toxinas passem através do intestino para a corrente sanguínea e penetrem o cérebro. Se você sofre de depressão, ansiedade, fog mental ou alguma doença cerebral autoimune, a possibilidade de ter um cérebro permeável deve ser considerada.

Trigo com muito glúten

O glúten, no papel de vilão, chegou às manchetes recentemente. Antes quase todos comiam trigo sem problemas, e ele era considerado um cereal saudável. O trigo mudou muito nos últimos 50 anos por hibridização e modificação genética, além de sofrer um excesso de refino. Nossos genes estão vivendo em um mundo novo e tóxico, onde uma interação genética errada com a proteína do glúten determina se, quando e como um problema no cérebro será acionado.

Sistema nervoso entérico

O eixo cérebro-intestino é uma rede neural de comunicação complexa ligando os dois órgãos. O sistema nervoso central (no cérebro) e o sistema nervoso entérico (no intestino) são ligados por diversos caminhos metabólicos, tal a sua importância.   Estas linhas de comunicação são bidirecionais e envolvem uma grande quantidade de mediadores neuro-imuno-endócrinos. A razão para o desenvolvimento de uma rede tão complexa é manter a fisiologia intestinal (nosso “segundo cérebro”) e sua ligação com funções cognitivas e afetivas. 95% da serotonina (neurotransmissor do bem-estar) é produzida no intestino! Além da serotonina, pelo menos outros 30 neurotransmissores são produzidos no intestino, como dopamina e GABA.

Flora intestinal

Tudo que beneficia o intestino é bom para o cérebro! Recentemente, o papel da flora intestinal (microbiota) foi reconhecido como parte do eixo cérebro-intestino. A alimentação, visando corrigir a permeabilidade intestinal e melhorar a microbiota, tem sido estudada como uma importante aliada da saúde cerebral. Ainda estamos engatinhando neste campo fascinante do microbioma, com sua imensa complexidade e tamanho – são mais de cem trilhões (100.000.000.000.000) de bactérias, vírus, fungos e outros micro-organismos, que determinam a nossa saúde, peso, humor e muito mais.

Texto elaborado por: Dra. Tamara Mazaracki.

Título de Especialista em Nutrologia –  Associação Brasileira de Nutrologia;

Membro Titular da ABRAN – Associação Brasileira de Nutrologia;

Pós-graduação em Medicina Ortomolecular, Nutrição Celular e Longevidade – FACIS-IBEHE – Faculdade de Ciências da Saúde de São Paulo e Centro de Ensino Superior de Homeopatia;

Pós-graduação em Medicina Estética – Instituto Brasileiro de Pesquisa e Ensino – IBRAPE.

As informações contidas neste blog, não devem ser substituídas por atendimento presencial aos profissionais da área de saúde, como médicos, nutricionistas, psicólogos, educadores físicos e etc. e sim, utilizadas única e exclusivamente, para seu conhecimento.


Referências Bibliográficas:


*Public Health 2013. Changing patterns of neurological mortality in 10 major developed countries - 1979-2010.

*Neuroscience and Biobehavioral Reviews 2009. Evidence for a cytokine model of cognitive function.

*Psychiatric Quarterly 2012. Neurologic and Psychiatric Manifestations of Celiac Disease and Gluten Sensitivity.

*American Journal of Gastroenterology 2016. Neurological Dysfunction in Coeliac Disease and Non-Coeliac Gluten Sensitivity.

*Clinical Nutrition 2015. Non coeliac gluten sensitivity - A new disease with gluten intolerance.
*Human Nutrition from the Gastroenterologist’s Perspective 2016. Gut–Brain Axis: A New Revolution to Understand the Pathogenesis of Autism and Other Severe Neurological Diseases.

*Current Opinion in Biotechnology 2015. Gut brain axis: diet microbiota interactions and implications for modulation of anxiety and depression.

*Annals of Gastroenterology 2015. The gut-brain axis: interactions between enteric microbiota, central and enteric nervous systems.

*Clinical Nutrition Experimental 2016. Food for thought: The role of nutrition in the microbiota-gut–brain axis.

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