O consumo diário de couve pode diminuir a
ação dos hormônios tireoidianos? E pode afetar quem tem hipotireoidismo? Este é
um questionamento comum, pois informações desencontradas são divulgadas na
internet e na mídia. Os vegetais crucíferos (do gênero Brassica) compõem uma
grande parte do conjunto de verduras e legumes consumidos diariamente. São
crucíferos a couve, brócolis, rúcula, agrião, repolho, couve-flor,
couve-de-bruxelas, acelga, rabanete, nabo, mostarda, raiz forte (wasabi). Atualmente alguns deles se tornaram muito
populares como ingredientes em sucos verdes, com uso diário. No entanto,
compostos presentes nestes vegetais, como os isotiocianatos, têm sido acusados
de interferir com a capacidade do organismo de absorver iodo, um mineral
essencial para o funcionamento da tireoide, e são denominados “bociogênicos”.
Isotiocianato
– amigo ou inimigo?
Estes compostos químicos “poderiam suprimir a
função da tireoide” ocasionando a formação de bócio, que é um inchaço e
crescimento desordenado da glândula. Os agentes bociogênicos mais comuns são as
isoflavonas, isotiocianatos e flúor. Eles estão presentes em uma grande
variedade de alimentos: soja e derivados (leite de soja, tofu, proteína de
soja, carne de soja), mandioca, batata-doce, sementes oleaginosas (amêndoa,
castanha de caju, noz, semente de abóbora e de linhaça), amendoim, uva, pera,
pêssego, morango, espinafre, chá e os vegetais crucíferos (citados acima). Por
outro lado, os crucíferos são extremamente saudáveis e devem fazer parte da
nossa dieta diária porque são ricos em compostos contendo enxofre,
glucosinolatos e indol-3-carbinol, que promovem a desintoxicação do corpo,
melhoram a saúde do coração e reduzem consideravelmente o risco de câncer.
Vegetais
crucíferos não prejudicam a tireoide!
Os isotiocianatos dos vegetais crucíferos
exercem um poderoso efeito protetor contra muitos tipos de câncer, incluindo
mama, cólon, bexiga, próstata, pulmão e tireoide, o que faz dos crucíferos
alimentos essenciais à saúde. A preocupação sobre os possíveis efeitos
negativos de crucíferos na função tireoidiana surgiu a partir de estudos com
animais, com resultados sugerindo que isotiocianatos poderiam interferir com a
síntese de hormônio da tireoide ou competir com a captação de iodo pela
glândula. No entanto, isto não foi confirmado em estudos com seres humanos, e o
consenso científico atual é que os vegetais crucíferos só poderiam ser
prejudiciais para a tireoide em casos de deficiência severa de iodo ou uma
ingestão de iodo insuficiente.
Excesso
faz mal!
Alguns alimentos podem ter ação bociogênica
se consumidos em excesso (muita quantidade mesmo!), ou se a pessoa tem uma
ingestão de iodo baixa. Na realidade, é quase impossível consumir crucíferos
suficientes para prejudicar a tireoide. Houve um caso isolado de uma mulher de
88 anos que desenvolveu bócio e hipotireoidismo agudo depois de comer um quilo
e meio de bok choy (um tipo de couve) cru, diariamente e por vários meses,
acreditando que isto poderia ajudar no seu diabetes – aí sim houve uma ingestão
excessiva e prejudicial!
Iodo
na alimentação
No Brasil a deficiência de iodo é raríssima
porque aqui se consome o sal iodado, que garante um suprimento mínimo para
prevenir o bócio. A glândula tireoide precisa de iodo para sintetizar tiroxina
(T4) e triiodotironina (T3), hormônios que regulam o metabolismo e atuam no
crescimento e no desenvolvimento. Se você quiser assegurar o iodo de cada dia,
invista em pescados, frutos do mar e algas marinhas. Em menor quantidade o iodo
está presente no ovo, aspargo, cogumelo, espinafre, gergelim, alho, couve e
abobrinha.
Aprendendo
com a dieta dos veganos
Se os vegetais crucíferos podem alterar a
função da tireoide de forma negativa, os veganos e vegetarianos teriam uma
chance muito maior de apresentar hipotireoidismo ou bócio, levando-se em conta
a sua alta ingestão de alimentos de origem vegetal. Para se averiguar esta
possibilidade foram feitas pesquisas com indivíduos que não ingerem proteínas
de origem animal (veganismo) ou seguem a dieta ovolactovegetariana. Ambos
consomem quantidades maiores de vegetais, incluindo crucíferos, do que os que
seguem uma dieta onívora (com produtos de origem animal e vegetal). A conclusão
foi que a dieta vegana protege contra doença autoimune tireoidiana e é
associada com um risco ligeiramente menor de hipotireoidismo do que a dieta
onívora. Além dos vegetais crucíferos, os veganos e vegetarianos tendem a
consumir muita soja, um grão rico em genisteína, com marcante ação bociogênica.
Ou seja, se você não exagera tomando 1 litro de suco verde por dia, todo dia,
não há nenhum problema relacionado à sua tireoide que o impeça de ter os
enormes benefícios de consumir couve, repolho, brócolis e todos os outros
componentes do gênero Brassica.
Coma
crucíferos para estimular a imunidade e prevenir o câncer!
A informação de que comer vegetais crucíferos
diariamente é danosa à tireoide (ou de que aqueles com hipotireoidismo devem
reduzir ou evitar o consumo de couve, repolho e outros crucíferos) não procede!
Se a sua tireoide funciona normalmente, ou mesmo se você tem hipotireoidismo,
não há nenhuma razão para evitar ou restringir o consumo de vegetais
crucíferos. Há ainda muito para ser desvendado sobre a ação de vegetais
crucíferos na prevenção do câncer, mas os resultados das pesquisas sugerem que
adultos devem consumir pelo menos cinco porções semanais. Além disso, os
crucíferos têm inúmeros outros benefícios: muitos nutrientes, fibras, poucas
calorias, efeito detox, ação imunoestimulante, ação reguladora e protetora do
intestino, ação prebiótica. Procure sempre variar entre os diferentes tipos de
vegetais para obter toda a gama de fitonutrientes.
Muitas
ações benéficas
Brócolis, couve-flor e outros vegetais
crucíferos ajudam a prevenir o aparecimento e deter a progressão de tumores do
cólon, mama, próstata, tireoide e outros. Estes compostos naturais estão
ligados a este hormônio e seus derivados químicos, os xenoestrógenos), além de
contribuir para neutralizar a ação do ataque diário de produtos químicos
causadores de câncer (poluentes diversos, agrotóxicos, inseticidas, etc.).
Xenoestrógenos
Xenoestrógenos são substâncias sintéticas
estranhas ao nosso corpo. Eles imitam a ação do hormônio estrogênio, com efeito
tóxico e carcinogênico, porque têm uma estrutura molecular semelhante ao
hormônio feminino e conseguem se acoplar aos receptores de estrogênio,
presentes em nossas células. Xenoestrógenos também podem se fixar em receptores
de testosterona, competindo com o hormônio masculino e reduzindo a sua
ação. Eles têm ação prolongada no corpo,
gerando desequilíbrio hormonal com predominância estrogênica em mulheres e
homens. Estes estrogênios “genéricos”
se originam de derivados de petróleo, pesticidas, plásticos e hormônios
sintéticos. De fato, eles estão em toda parte, nós vivemos em um mundo
banhado por xenoestrógenos. A
consequência potencial desta exposição é alarmante, com um considerável
aumento da incidência de câncer de mama, ovário, testículo e próstata.
Infertilidade, endometriose e puberdade precoce são outros problemas causados
pelos xenoestrógenos.
Crucíferos
neutralizam xenoestrógenos
Embora seja impossível evitar completamente
estes contaminantes, a pesquisa mostra que é possível aumentar a proteção
contra eles, consumindo os fitoquímicos presentes em vegetais crucíferos. Eles
incluem os isotiocianatos, indol-3-carbinol e outros compostos que aumentam a
eficácia do sistema de desintoxicação primária do corpo através do fígado e
suas enzimas, transformando substâncias tóxicas e cancerígenas em compostos
inofensivos que podem ser eliminados pelo corpo com segurança. Já tomou seu
suco verde hoje?
Texto elaborado por: Dra. Tamara Mazaracki.
Título
de Especialista em Nutrologia – Associação Brasileira de Nutrologia;
Membro
Titular da ABRAN – Associação Brasileira de Nutrologia;
Pós-graduação
em Medicina Ortomolecular, Nutrição Celular e Longevidade – FACIS-IBEHE –
Faculdade de Ciências da Saúde de São Paulo e Centro de Ensino Superior de
Homeopatia;
Pós-graduação
em Medicina Estética – Instituto Brasileiro de Pesquisa e Ensino – IBRAPE.
As informações contidas neste blog, não devem ser substituídas
por atendimento presencial aos profissionais da área de saúde, como médicos,
nutricionistas, psicólogos, educadores físicos e etc. e sim, utilizadas única e
exclusivamente, para seu conhecimento.
Referências
Bibliográficas:
*European Journal of Nutrition 2008. The cancer chemopreventive actions of phytochemicals
derived from glucosinolates.
*Human Nutrition Research Center on Aging 2013. Cruciferous Vegetables In An Evidence-based Approach to
Phytochemicals and Other Dietary Factors.
*New England
Journal of Medicine 2010. Myxedema Coma Induced by Ingestion of Raw Bok Choy.
* Nutrients 2013. Vegan
diets and hypothyroidism.
*Current Pharmacology Reports 2015. The Epigenetic Impact of Cruciferous
Vegetables on Cancer Prevention.
*Cancer Prevention Research 2009. Cruciferous Vegetable Intake and Cancer
Prevention: Role of Nutrigenetics.
*Cell Cycle
2005. Molecular targets and anticancer potential of indole-3-carbinol and its
derivatives.
*The Journal of
Nutrition 2000. Indole-3-carbinol is a negative regulator of estrogen
receptor-alpha signaling in human tumor cells.
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