O
Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) é uma doença inflamatória crônica de origem
autoimune, cujos sintomas podem surgir em diversos órgãos de forma lenta e
progressiva (em meses) ou mais rapidamente (em semanas) e variam com fases de
atividade e de remissão. São reconhecidos 2 tipos principais de lúpus: o
cutâneo, que se manifesta apenas com manchas na pele (geralmente avermelhadas
ou eritematosas e daí o nome de lúpus eritematoso), principalmente nas áreas
que ficam expostas à luz solar (rosto, orelhas, colo (“V” do decote) e nos
braços) e o sistêmico, no qual um ou mais órgãos internos são acometidos.
Por ser uma doença do sistema
imunológico, que é responsável pela produção de anticorpos e organização dos
mecanismos de inflamação em todos os órgãos, quando a pessoa tem LES ela pode
ter diferentes tipos de sintomas em vários locais do corpo.
É uma doença rara, incidindo mais
frequentemente em mulheres jovens, ou seja, na fase reprodutiva. A incidência
estimada do LES em diferentes locais do mundo é de aproximadamente 1 a 22 casos
para cada 100.000 pessoas por ano e a prevalência pode variar de 7 a 160 casos
para cada 100.000 pessoas. No Brasil, estima-se uma incidência de LES em torno
de 8,7 casos para cada 100.000 pessoas por ano, de acordo com um estudo
epidemiológico realizado na região Nordeste. A doença pode ocorrer em todas as etnias.
A etiologia do LES permanece ainda
pouco conhecida, porém sabe-se da importante participação de fatores hormonais,
ambientais, genéticos e imunológicos para o surgimento da doença. Portanto,
pessoas que nascem com susceptibilidade genética para desenvolver a doença, em
algum momento, após uma interação com fatores ambientais (irradiação solar,
infecções virais ou por outros microorganismos), passam a apresentar alterações
imunológicas. A principal alteração é o desequilíbrio na produção de anticorpos
que reagem com proteínas do próprio organismo e causam inflamação em diversos
órgãos como na pele, mucosas, pleura e pulmões, articulações, rins etc.. Dessa
forma, entendemos que o tipo de sintoma que a pessoa desenvolve, depende do
tipo de autoanticorpo que a pessoa tem e, que como o desenvolvimento de cada
anticorpo se relaciona às características genéticas de cada pessoa, cada pessoa
com lúpus tende a ter manifestações clínicas (sintomas) específicas e muito
pessoais.
Sintomas
Os sintomas do LES são diversos e
tipicamente variam em intensidade de acordo com a fase de atividade ou remissão
da doença. É muito comum que a pessoa apresente manifestações gerais como
cansaço, desânimo, febre baixa (mas raramente, pode ser alta), emagrecimento e
perda de apetite. As manifestações podem ocorrer devido a inflamação na pele,
articulações (juntas), rins, nervos, cérebro e membranas que recobrem o pulmão
(pleura) e o coração (pericárdio). Outras manifestações podem ocorrer devido a
diminuição das células do sangue (glóbulos vermelhos e brancos), devido a
anticorpos contra essas células.
Esses sintomas podem surgir isoladamente, ou em
conjunto e podem ocorrer ao mesmo tempo ou de forma sequencial. Crianças,
adolescentes ou mesmo adultos podem apresentar inchação dos gânglios (ínguas),
que geralmente é acompanhada por febre e pode ser confundida com os sintomas de
infecções como a rubéola ou mononucleose.
Diagnóstico
O diagnóstico é feito
através do reconhecimento pelo médico de um ou mais dos sintomas acima. Ao
mesmo tempo, como algumas alterações nos exames de sangue e urina são muito
características, eles também são habitualmente utilizados para a definição
final do diagnóstico. Exames comuns de sangue e urina são úteis não só para o
diagnóstico da doença, mas também são muito importantes para definir se há
atividade do LES. Embora não exista um exame que seja exclusivo do LES (100%
específico), a presença do exame chamado FAN (fator ou anticorpo antinuclear), principalmente
com títulos elevados, em uma pessoa com sinais e sintomas característicos de
LES, permite o diagnóstico com muita certeza. Outros testes laboratoriais como
os anticorpos anti-Sm e anti-DNA são muito específicos, mas ocorrem em apenas 40%
a 50% das pessoas com LES. Ao mesmo tempo, alguns exames de sangue e/ou de urina
podem ser solicitados para auxiliar não no diagnóstico do LES, mas para
identificar se há ou não sinais de atividade da doença.
Tratamento
O tratamento da pessoa
com LES depende do tipo de manifestação apresentada e deve, portanto, ser
individualizado. Dessa forma a pessoa com LES pode necessitar de um, dois ou
mais medicamentos em uma fase (ativa da doença) e, poucos ou nenhum medicamento
em outras fases (não ativas ou em remissão). Ao mesmo tempo, o tratamento
sempre inclui remédios para regular as alterações imunológicas do LES e de
medicamentos gerais para regular alterações que a pessoa apresente em consequência
da inflamação causada pelo LES, como hipertensão, inchaço nas pernas, febre,
dor etc.
Além dos aspectos específicos
relacionados ao tratamento medicamentoso, algumas medidas de suporte, como
orientação sobre a doença, apoio psicossocial, atividade física e, de forma
particular, a abordagem dietética, são essenciais para um atendimento integral
dos pacientes com LES. De fato, a dieta pode auxiliar no controle do quadro
inflamatório da doença e das complicações da própria terapêutica. Tendo em
vista que o risco cardiovascular parece ser aumentado em pacientes com LES
devido à maior freqüência de condições associadas à aterosclerose, como
dislipidemia, diabetes melito, síndrome metabólica e obesidade, a orientação
dietética surge como um importante meio para minimizar essas complicações da
doença.
A autoimunidade e o processo
inflamatório do LES estão diretamente relacionados a alterações do perfil
lipídico e ao metabolismo de lipoproteínas na doença. O padrão de
dislipoproteinemia, próprio do LES, é caracterizado por maiores níveis de
triglicérides (TG) e de lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL) associado
a menores níveis de lipoproteína de alta densidade (HDL). Pacientes tanto com
doença ativa quanto inativa apresentam essas alterações lipídicas, mas elas são
agravadas pela maior atividade inflamatória da doença, o que demonstra que o
LES, por si só, promove um perfil de lipoproteínas proaterogênico. Uma redução
da atividade enzimática da lipase lipoprotéica é responsável por determinar uma
dislipoproteinemia própria da doença, pois esta promove menor catabolismo de
lipoproteínas ricas em TG (quilomícrons e VLDL) devido à presença de anticorpos
antilipase lipoprotéica (anti-LPL) ou por ação do fator-α de necrose tumoral
(TNF-α).
Vários medicamentos utilizados
no LES promovem alterações deletérias no perfil lipídico previamente alterado
pela própria doença, com importância particular para o efeito dos corticosteroides.
Seu uso crônico no LES está associado ao aumento do colesterol total e de suas frações
e dos TG, que pode ser observado após um período de 1–2 meses de uso. Além
disso, os corticosteroides induzem o aparecimento de outros fatores de risco,
como obesidade, hipertensão arterial sistêmica (HAS), hiperinsulinemia e
resistência insulínica.
A hiperinsulinemia
aumenta o estresse oxidativo, que é considerado um importante mecanismo
fisiopatológico para o desenvolvimento da aterosclerose. Alguns estudos revelam
que o DM é significativamente mais comum em pacientes com LES que na população
em geral, devido à redução da sensibilidade à insulina, e que aproximadamente
18%–38% dos pacientes apresentam síndrome metabólica.
Os pacientes com LES
apresentam três ou mais fatores de risco para doença cardiovascular, particularmente
obesidade, HAS e dislipidemias, sugerindo que são realmente mais suscetíveis à
síndrome metabólica. Uma avaliação brasileira do estado nutricional com 170
pacientes com LES verificou prevalência de magreza grau I de 1,2% e de excesso
de peso de 64,2% (35,9% de sobrepeso; 21,8% de obesidade grau I; 4,1% de
obesidade grau II; 2,4% de obesidade grau III). A eutrofia, segundo o Índice de
Massa Corporal (IMC), foi verificada em apenas 34,7% dos pacientes avaliados, e
conclui-se que o excesso de peso é um distúrbio frequente durante o seguimento
de pacientes com LES. Nesse sentido, é de suma importância estabelecer
estratégias, como programas de incentivo à prática de atividade física para
redução do peso corporal e aconselhamento nutricional a fim de reduzir os
riscos da síndrome.
Acrescenta-se o fato de que a dieta hiperlipídica
(rica em colesterol e gordura saturada) é um dos principais fatores para a
manutenção da dislipidemia na doença, fazendo perpetuar e agravar as alterações
do perfil lipídico. Em contrapartida, nutrientes antioxidantes como β-caroteno,
α-tocoferol, ácido ascórbico e selênio são conhecidos como protetores contra
danos tissulares por meio da ativação de macrófagos, monócitos e granulócitos,
assim como pela supressão da atividade das citocinas e do TNF-α.
Uma promissora forma de abordagem do LES é a
dietoterapia, com indicação de alimentação rica em vitaminas, minerais
(principalmente os antioxidantes) e ácidos graxos mono/poliinsaturados e
moderado consumo energético, visando à redução dos marcadores inflamatórios e
ao auxílio no tratamento dessas comorbidades e das reações adversas aos
medicamentos.
Orientações
Alimentares
♦ Consumir alimentos de todos os grupos alimentares tornando o prato bem
colorido para obter a maior quantidade possível de vitaminas, minerais e
antioxidantes. Isso fortalecerá o sistema imunológico;
♦ Alimenta-se com maior quantidade de fibras: verduras, legumes, frutas
e cereais integrais (aveia, farelos, linhaça, granola, pães e biscoitos
integrais);
♦ Ingerir alimentos fontes de vitamina A, E e selênio, por melhorarem o
sistema imune protegendo o organismo contra infecções e por reduzirem a atividade
inflamatória. As principais fontes desses nutrientes são: couve-flor, brócolis,
repolho, espinafre, couve, cenoura, tomate, abóbora, mamão, manga, leite (de
preferência desnatado), castanhas, nozes, avelã, amêndoa e cereais integrais,
principalmente a linhaça;
♦ Aumentar o consumo de fontes de cálcio, principalmente no uso de
corticóides: leite e iogurte desnatados, ricota, queijo fresco, cottage, queijo
de soja (tofu) e vegetais verde escuros;
♦ Controlar ao máximo o consumo de sal e de alimentos ricos em sódio:
enlatados, sopas prontas, tempero de macarrão instantâneo, temperos e caldos
industrializados, frios, embutidos, conservas, margarina com sal, salgadinhos
de pacote;
♦ Restringir ao máximo o consumo de álcool e refrigerantes;
♦ Moderar o consumo de carboidratos para não elevar o peso e a glicemia
(açúcar no sangue): doces, arroz, massas, batata, mandioca, farinhas e pães;
♦ Evitar ao máximo preparações gordurosas que possam elevar o peso
corpóreo e aumentar os níveis de colesterol e triglicérides: frituras,
maionese, fast foods, carnes gordas, pele de frango, camarão, miúdos, bacon,
lingüiça, salsicha, presunto, mortadela, salame, doces cremosos, queijos
gordurosos, coco e sorvetes à base de leite;
♦ Aumentar o consumo de alimentos que contêm ácido graxo poliinsaturado
ômega 3. Esse tipo de gordura tem a capacidade de prevenir doenças
cardiovasculares por reduzir os níveis de colesterol e hipertensão, além de
melhorar o estado inflamatório. O ômega 3 está presente em peixes como
sardinha, atum, salmão, arenque, bacalhau, cavala, em sementes de linhaça, no
óleo de peixe, no de canola e de soja, no azeite de oliva, nas castanhas, nozes
e amêndoas;
♦ Não consumir os alimentos fontes de ômega 6. Esse tipo de gordura foi
implicada no aparecimento da proteinúria e edema na síndrome nefrótica
(possível complicação do LES). Essa gordura é encontrada no óleo de milho, de
girassol, de algodão, de açafrão e na semente de papoula;
♦ Finalmente, os pacientes com lúpus devem evitar ao máximo qualquer
produto que contenha alfafa (comum em preparações na América do Norte), pois,
segundo estudos, pode desenvolver sintomas e/ou ativar a doença.
As informações contidas neste blog, não devem ser substituídas
por atendimento presencial aos profissionais da área de saúde, como médicos,
nutricionistas, psicólogos, educadores físicos e etc. e sim, utilizadas única e
exclusivamente, para seu conhecimento.
Referências Bibliográficas:
Klack, K; Bonfa, E; Neto, EFB. Dieta e aspectos
nutricionais no lúpus eritematoso sistêmico. Rev Bras Reumatol 2012, v.52, n.3:
p.384-408.
Klack, K. Que cuidados com a alimentação devem ter
os pacientes com doenças reumáticas em especial os portadores de artrites e
lúpus? Disponível em: www.reumatoguia.com.br
Acessado em: 06/06/2013.
Lúpus. Sociedade Brasileira de Reumatologia.
Disponível: www.reumatologia.com.br
Acessado em: 06/06/2013.
Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas – Lúpus
Eritematoso Sistêmico. Ministério da Saúde. Disponível em: www.saude.gov.br Acessado em: 06/06/2013.
Sato, EL; Bonfa, ED,
Costallat, LTL et al. Lúpus Eritematoso Sistêmico: Tratamento do
Acometimento Cutâneo/Articular. Soc. Bras Reumatol.[Projeto Diretrizes] 2004,
p.1-8.
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