segunda-feira, 17 de junho de 2013

Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES)



O Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) é uma doença inflamatória crônica de origem autoimune, cujos sintomas podem surgir em diversos órgãos de forma lenta e progressiva (em meses) ou mais rapidamente (em semanas) e variam com fases de atividade e de remissão. São reconhecidos 2 tipos principais de lúpus: o cutâneo, que se manifesta apenas com manchas na pele (geralmente avermelhadas ou eritematosas e daí o nome de lúpus eritematoso), principalmente nas áreas que ficam expostas à luz solar (rosto, orelhas, colo (“V” do decote) e nos braços) e o sistêmico, no qual um ou mais órgãos internos são acometidos.

Por ser uma doença do sistema imunológico, que é responsável pela produção de anticorpos e organização dos mecanismos de inflamação em todos os órgãos, quando a pessoa tem LES ela pode ter diferentes tipos de sintomas em vários locais do corpo.

            É uma doença rara, incidindo mais frequentemente em mulheres jovens, ou seja, na fase reprodutiva. A incidência estimada do LES em diferentes locais do mundo é de aproximadamente 1 a 22 casos para cada 100.000 pessoas por ano e a prevalência pode variar de 7 a 160 casos para cada 100.000 pessoas. No Brasil, estima-se uma incidência de LES em torno de 8,7 casos para cada 100.000 pessoas por ano, de acordo com um estudo epidemiológico realizado na região Nordeste. A doença pode ocorrer em todas as etnias.

            A etiologia do LES permanece ainda pouco conhecida, porém sabe-se da importante participação de fatores hormonais, ambientais, genéticos e imunológicos para o surgimento da doença. Portanto, pessoas que nascem com susceptibilidade genética para desenvolver a doença, em algum momento, após uma interação com fatores ambientais (irradiação solar, infecções virais ou por outros microorganismos), passam a apresentar alterações imunológicas. A principal alteração é o desequilíbrio na produção de anticorpos que reagem com proteínas do próprio organismo e causam inflamação em diversos órgãos como na pele, mucosas, pleura e pulmões, articulações, rins etc.. Dessa forma, entendemos que o tipo de sintoma que a pessoa desenvolve, depende do tipo de autoanticorpo que a pessoa tem e, que como o desenvolvimento de cada anticorpo se relaciona às características genéticas de cada pessoa, cada pessoa com lúpus tende a ter manifestações clínicas (sintomas) específicas e muito pessoais.

Sintomas

            Os sintomas do LES são diversos e tipicamente variam em intensidade de acordo com a fase de atividade ou remissão da doença. É muito comum que a pessoa apresente manifestações gerais como cansaço, desânimo, febre baixa (mas raramente, pode ser alta), emagrecimento e perda de apetite. As manifestações podem ocorrer devido a inflamação na pele, articulações (juntas), rins, nervos, cérebro e membranas que recobrem o pulmão (pleura) e o coração (pericárdio). Outras manifestações podem ocorrer devido a diminuição das células do sangue (glóbulos vermelhos e brancos), devido a anticorpos contra essas células.

Esses sintomas podem surgir isoladamente, ou em conjunto e podem ocorrer ao mesmo tempo ou de forma sequencial. Crianças, adolescentes ou mesmo adultos podem apresentar inchação dos gânglios (ínguas), que geralmente é acompanhada por febre e pode ser confundida com os sintomas de infecções como a rubéola ou mononucleose.

Diagnóstico


            O diagnóstico é feito através do reconhecimento pelo médico de um ou mais dos sintomas acima. Ao mesmo tempo, como algumas alterações nos exames de sangue e urina são muito características, eles também são habitualmente utilizados para a definição final do diagnóstico. Exames comuns de sangue e urina são úteis não só para o diagnóstico da doença, mas também são muito importantes para definir se há atividade do LES. Embora não exista um exame que seja exclusivo do LES (100% específico), a presença do exame chamado FAN (fator ou anticorpo antinuclear), principalmente com títulos elevados, em uma pessoa com sinais e sintomas característicos de LES, permite o diagnóstico com muita certeza. Outros testes laboratoriais como os anticorpos anti-Sm e anti-DNA são muito específicos, mas ocorrem em apenas 40% a 50% das pessoas com LES. Ao mesmo tempo, alguns exames de sangue e/ou de urina podem ser solicitados para auxiliar não no diagnóstico do LES, mas para identificar se há ou não sinais de atividade da doença.

Tratamento

            O tratamento da pessoa com LES depende do tipo de manifestação apresentada e deve, portanto, ser individualizado. Dessa forma a pessoa com LES pode necessitar de um, dois ou mais medicamentos em uma fase (ativa da doença) e, poucos ou nenhum medicamento em outras fases (não ativas ou em remissão). Ao mesmo tempo, o tratamento sempre inclui remédios para regular as alterações imunológicas do LES e de medicamentos gerais para regular alterações que a pessoa apresente em consequência da inflamação causada pelo LES, como hipertensão, inchaço nas pernas, febre, dor etc.
 
            Além dos aspectos específicos relacionados ao tratamento medicamentoso, algumas medidas de suporte, como orientação sobre a doença, apoio psicossocial, atividade física e, de forma particular, a abordagem dietética, são essenciais para um atendimento integral dos pacientes com LES. De fato, a dieta pode auxiliar no controle do quadro inflamatório da doença e das complicações da própria terapêutica. Tendo em vista que o risco cardiovascular parece ser aumentado em pacientes com LES devido à maior freqüência de condições associadas à aterosclerose, como dislipidemia, diabetes melito, síndrome metabólica e obesidade, a orientação dietética surge como um importante meio para minimizar essas complicações da doença.

A autoimunidade e o processo inflamatório do LES estão diretamente relacionados a alterações do perfil lipídico e ao metabolismo de lipoproteínas na doença. O padrão de dislipoproteinemia, próprio do LES, é caracterizado por maiores níveis de triglicérides (TG) e de lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL) associado a menores níveis de lipoproteína de alta densidade (HDL). Pacientes tanto com doença ativa quanto inativa apresentam essas alterações lipídicas, mas elas são agravadas pela maior atividade inflamatória da doença, o que demonstra que o LES, por si só, promove um perfil de lipoproteínas proaterogênico. Uma redução da atividade enzimática da lipase lipoprotéica é responsável por determinar uma dislipoproteinemia própria da doença, pois esta promove menor catabolismo de lipoproteínas ricas em TG (quilomícrons e VLDL) devido à presença de anticorpos antilipase lipoprotéica (anti-LPL) ou por ação do fator-α de necrose tumoral (TNF-α).

            Vários medicamentos utilizados no LES promovem alterações deletérias no perfil lipídico previamente alterado pela própria doença, com importância particular para o efeito dos corticosteroides. Seu uso crônico no LES está associado ao aumento do colesterol total e de suas frações e dos TG, que pode ser observado após um período de 1–2 meses de uso. Além disso, os corticosteroides induzem o aparecimento de outros fatores de risco, como obesidade, hipertensão arterial sistêmica (HAS), hiperinsulinemia e resistência insulínica.

            A hiperinsulinemia aumenta o estresse oxidativo, que é considerado um importante mecanismo fisiopatológico para o desenvolvimento da aterosclerose. Alguns estudos revelam que o DM é significativamente mais comum em pacientes com LES que na população em geral, devido à redução da sensibilidade à insulina, e que aproximadamente 18%–38% dos pacientes apresentam síndrome metabólica.

            Os pacientes com LES apresentam três ou mais fatores de risco para doença cardiovascular, particularmente obesidade, HAS e dislipidemias, sugerindo que são realmente mais suscetíveis à síndrome metabólica. Uma avaliação brasileira do estado nutricional com 170 pacientes com LES verificou prevalência de magreza grau I de 1,2% e de excesso de peso de 64,2% (35,9% de sobrepeso; 21,8% de obesidade grau I; 4,1% de obesidade grau II; 2,4% de obesidade grau III). A eutrofia, segundo o Índice de Massa Corporal (IMC), foi verificada em apenas 34,7% dos pacientes avaliados, e conclui-se que o excesso de peso é um distúrbio frequente durante o seguimento de pacientes com LES. Nesse sentido, é de suma importância estabelecer estratégias, como programas de incentivo à prática de atividade física para redução do peso corporal e aconselhamento nutricional a fim de reduzir os riscos da síndrome.

Acrescenta-se o fato de que a dieta hiperlipídica (rica em colesterol e gordura saturada) é um dos principais fatores para a manutenção da dislipidemia na doença, fazendo perpetuar e agravar as alterações do perfil lipídico. Em contrapartida, nutrientes antioxidantes como β-caroteno, α-tocoferol, ácido ascórbico e selênio são conhecidos como protetores contra danos tissulares por meio da ativação de macrófagos, monócitos e granulócitos, assim como pela supressão da atividade das citocinas e do TNF-α.

Uma promissora forma de abordagem do LES é a dietoterapia, com indicação de alimentação rica em vitaminas, minerais (principalmente os antioxidantes) e ácidos graxos mono/poliinsaturados e moderado consumo energético, visando à redução dos marcadores inflamatórios e ao auxílio no tratamento dessas comorbidades e das reações adversas aos medicamentos.


Orientações Alimentares

♦ Consumir alimentos de todos os grupos alimentares tornando o prato bem colorido para obter a maior quantidade possível de vitaminas, minerais e antioxidantes. Isso fortalecerá o sistema imunológico;

♦ Alimenta-se com maior quantidade de fibras: verduras, legumes, frutas e cereais integrais (aveia, farelos, linhaça, granola, pães e biscoitos integrais);

♦ Ingerir alimentos fontes de vitamina A, E e selênio, por melhorarem o sistema imune protegendo o organismo contra infecções e por reduzirem a atividade inflamatória. As principais fontes desses nutrientes são: couve-flor, brócolis, repolho, espinafre, couve, cenoura, tomate, abóbora, mamão, manga, leite (de preferência desnatado), castanhas, nozes, avelã, amêndoa e cereais integrais, principalmente a linhaça;

♦ Aumentar o consumo de fontes de cálcio, principalmente no uso de corticóides: leite e iogurte desnatados, ricota, queijo fresco, cottage, queijo de soja (tofu) e vegetais verde escuros;

♦ Controlar ao máximo o consumo de sal e de alimentos ricos em sódio: enlatados, sopas prontas, tempero de macarrão instantâneo, temperos e caldos industrializados, frios, embutidos, conservas, margarina com sal, salgadinhos de pacote;

♦ Restringir ao máximo o consumo de álcool e refrigerantes;

♦ Moderar o consumo de carboidratos para não elevar o peso e a glicemia (açúcar no sangue): doces, arroz, massas, batata, mandioca, farinhas e pães;

♦ Evitar ao máximo preparações gordurosas que possam elevar o peso corpóreo e aumentar os níveis de colesterol e triglicérides: frituras, maionese, fast foods, carnes gordas, pele de frango, camarão, miúdos, bacon, lingüiça, salsicha, presunto, mortadela, salame, doces cremosos, queijos gordurosos, coco e sorvetes à base de leite;

♦ Aumentar o consumo de alimentos que contêm ácido graxo poliinsaturado ômega 3. Esse tipo de gordura tem a capacidade de prevenir doenças cardiovasculares por reduzir os níveis de colesterol e hipertensão, além de melhorar o estado inflamatório. O ômega 3 está presente em peixes como sardinha, atum, salmão, arenque, bacalhau, cavala, em sementes de linhaça, no óleo de peixe, no de canola e de soja, no azeite de oliva, nas castanhas, nozes e amêndoas;
 
♦ Não consumir os alimentos fontes de ômega 6. Esse tipo de gordura foi implicada no aparecimento da proteinúria e edema na síndrome nefrótica (possível complicação do LES). Essa gordura é encontrada no óleo de milho, de girassol, de algodão, de açafrão e na semente de papoula;

♦ Finalmente, os pacientes com lúpus devem evitar ao máximo qualquer produto que contenha alfafa (comum em preparações na América do Norte), pois, segundo estudos, pode desenvolver sintomas e/ou ativar a doença.

As informações contidas neste blog, não devem ser substituídas por atendimento presencial aos profissionais da área de saúde, como médicos, nutricionistas, psicólogos, educadores físicos e etc. e sim, utilizadas única e exclusivamente, para seu conhecimento.

Referências Bibliográficas:

Klack, K; Bonfa, E; Neto, EFB. Dieta e aspectos nutricionais no lúpus eritematoso sistêmico. Rev Bras Reumatol 2012, v.52, n.3: p.384-408.

Klack, K. Que cuidados com a alimentação devem ter os pacientes com doenças reumáticas em especial os portadores de artrites e lúpus? Disponível em: www.reumatoguia.com.br Acessado em: 06/06/2013.

Lúpus. Sociedade Brasileira de Reumatologia. Disponível: www.reumatologia.com.br Acessado em: 06/06/2013.

Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas – Lúpus Eritematoso Sistêmico. Ministério da Saúde. Disponível em: www.saude.gov.br Acessado em: 06/06/2013.

Sato, EL; Bonfa, ED, Costallat, LTL et al. Lúpus Eritematoso Sistêmico: Tratamento do Acometimento Cutâneo/Articular. Soc. Bras Reumatol.[Projeto Diretrizes] 2004, p.1-8.

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