A doença hepática
gordurosa não-alcoólica (DHGNA) é uma condição clínico patológica caracterizada
pelo acúmulo de lipídios no interior dos hepatócitos (células do fígado). O
quadro patológico lembra o da lesão induzida por álcool, mas ocorre em
indivíduos sem ingestão etílica significativa. A DHGNA é talvez a causa
principal de morbidade e mortalidade ligadas a doenças do fígado. A maioria dos
pacientes é assintomática, porém nos estágios avançados da doença pode surgir
desconforto abdominal, fadiga e mal-estar.
Denomina-se doença hepática gordurosa
não alcoólica um espectro de várias condições – esteatose (presença de
infiltração gordurosa no fígado), esteatoepatite (infiltração gordurosa no
fígado associada à inflamação e destruição de células do fígado), fibrose,
cirrose (é a substituição do fígado normal por fibrose (cicatriz), que causa um
“endurecimento” do fígado e dificulta seu funcionamento, o que acarreta na
diminuição na produção de proteínas, por exemplo) – todas relacionadas ao
depósito de gordura no fígado.
Sua prevalência mundial ainda não foi
determinada, mas parece ser a doença hepática mais comum no mundo ocidental, e
está aumentando de maneira importante principalmente nos obesos. É referido que
a DHGNA ocorre em 20% da população, sendo que sua prevalência ultrapassa 50%
quando são avaliados pacientes obesos ou diabéticos, considerando-se a doença
hepática mais freqüente nos Estados Unidos.
Embora o Ministério da Saúde não tenha
estatísticas oficiais sobre a incidência da doença no país, os dados existentes
sobre a saúde do brasileiro mostram que boa parte da população está no alvo da
esteatose: 48% dos brasileiros têm excesso de peso, um em cada cinco é fumante
e 27% dos homens ingerem mais de quatro doses de bebida cada vez que decidem
ingerir álcool.
O estilo de vida “moderno”,
caracterizado por dietas ricas em gorduras e pobres em fibras, associado ao
sedentarismo, uso abusivo de álcool, tabagismo e estresse, independente das
condições econômicas e sociais, tem tido um papel importante na epidemia de
obesidade.
É importante que se diga que a DHGNA
está associada com a chamada síndrome metabólica. Os critérios dessa síndrome,
definidos pelo National Institute of Health (NHI), são os que se seguem:
glicose de jejum maior ou igual a 110mg/dL; obesidade central (circunferência
da cintura maior do que 102cm em homem e 88cm em mulheres); pressão arterial
igual ou superior a 130/85mmHg ou tratada farmacologicamente; níveis de
triglicerídeos superiores a 150mg/dL ou em uso de fibratos, e colesterol HDL (bom colesterol)
menor que 40mg/dL (homem) e 50mg/dL (mulher). Sabidamente, os portadores dessa
síndrome apresentam uma maior morbi-mortalidade associada a doenças
cardiovasculares.
Classificação
A DHGNA pode ser classificada de
acordo com a sua etiologia como:
●
Primária: condições associadas à
síndrome metabólica, diabetes melito tipo 2, obesidade e hiperlipidemia.
●
Secundária:
- Drogas: corticóides, estrogênios
sintéticos bloqueadores dos canais de cálcio, amiodarone, perexilina,
nifedipina e tamoxifeno;
- Procedimentos cirúrgicos: desvio
jejunoileal e ressecção extensiva do intestino delgado;
- Outras condições: nutrição parenteral
total, toxinas ambientais e doença de Weber-Christian (doença rara, que se
apresenta com inflamação recorrente da camada adiposa da pele).
●
Indefinida: supercrescimento
bacteriano intestinal, sobrecarga de ferro e hepatite.
Tipos
A
esteatose hepática não-alcoólica abrange um amplo espectro, sendo categorizados
em:
● DHGNA tipo I: esteatose simples;
●
DHGNA tipo II: esteatose seguida de inflamação do hepatócito (célula do
fígado);
●
DHGNA tipo III: esteatose com injúria no hepatócito ou degeneração
(balonização);
●
DHGNA tipo IV: esteatose seguida de fibrose sinusoidal, corpúsculos de Mallory
ou ambos.
A esteatoepatite (NASH) é
considerada a forma mais severa da DHGNA (tipos 3 e 4) e apresenta-se associada
com resultados clínicos adversos, incluindo a cirrose e o carcinoma
hepatocelular, os quais podem levar à morte.
O "fígado gorduroso" (F) tem
aspecto mais amarelado e esbranquiçado, geralmente também com um volume um
pouco maior do que o fígado normal (N).
Suspeita-se de DHGNA quando o exame
clínico e o ultrassom abdominal demonstram hepatomegalia (aumento do tamanho do
fígado) e este último acúmulo de lipídios no fígado e/ou quando as
aminotransferases estão discretas (duas a três vezes o valor de referência) e
persistentemente (em duas ou mais ocasiões) elevadas em indivíduos sem qualquer
causa que justifique estas alterações (exclusão de outras doenças hepáticas).
Os mecanismos envolvidos no
desenvolvimento e progressão da DHGNA ainda não são bem esclarecidos, porém a
resistência insulínica (vide post diabetes), o estado inflamatório, entre
outros fatores genéticos, dietéticos e estilo de vida, exercem papel-chave na
gênese desta doença.
Uma das hipóteses é que a origem da
esteatose hepática deve-se ao acúmulo de triglicérides (vide post gorduras) nos
hepatócitos, o que eleva o metabolismo lipídico local, resultando em maior
estresse oxidativo mitocondrial, formando espécies reativas de oxigênio (ROS – reative oxigen species). Outra hipótese
para o desenvolvimento da DHGNA é que o aumento de ROS promove elevação da
peroxidação lipídica da membrana celular, da secreção de citocinas
pró-inflamatórias, como, por exemplo, o fator de necrose tumoral alfa (TNF-α),
danos à célula de Kupffer e consumo de enzimas e vitaminas antioxidantes no
fígado. Observa-se também a autoperpetuação do ciclo de resistência insulínica e
inflamação pela ativação crônica da quinase (proteína) inibitória capa
beta (IKκβ) e interações com o fator de transcrição nuclear NFκβ. A ativação
direta das células esteladas hepáticas também pode ocorrer pela hiperglicemia e
hiperinsulinemia causada por regulação ascendente dos fatores de crescimento do
tecido conjuntivo.
Fatores Nutricionais
Numa dieta com alta densidade
energética, o excesso de carboidratos e/ou lipídios pode levar a uma elevação
crônica da glicose, insulina e ácidos graxos livres no sangue. Estas condições
dietéticas contribuem para a resistência à insulina. O transporte de glicose da
corrente sanguínea para o hepatócito ocorre por mecanismos
não-insulino-dependentes (não depende da insulina); desta forma, elevações na
concentração de glicose circulante promovem uma maior captação hepática de
glicose. A lipogênese de novo mediada
pela insulina estimula o aumento da conversão de glicose em ácidos graxos; vale
ressaltar que este processo ocorre principalmente no fígado. Sendo assim, a
elevação tanto das concentrações de glicose quanto dos ácidos graxos no sangue
contribui para o acúmulo de lipídios no fígado.
O consumo de gordura diário não pode
ultrapassar 30% do valor calórico total de uma dieta. Quem consome quantidades
elevadas de gordura na dieta, mesmo que sejam as chamadas gorduras saudáveis,
podem desenvolver esteatose hepática. O tipo mais perigoso, no entanto, é a
gordura trans, porque é a que mais induz depósito de gordura no fígado. Ela é encontrada em biscoitos, salgadinhos, pão de queijo, folhados e outros
tipos de alimento.
Essa relação com hábitos nada
saudáveis também explica como é formado o grupo de maior risco para desenvolver
a doença. Os obesos, os diabéticos (do tipo 2) e os homens (mais numerosos do
que as mulheres entre os fumantes e os dependentes de bebidas alcoólicas) são
maioria entre os pacientes.
Tratamento da
esteatose
O tratamento consiste em combater os
fatores desencadeantes: redução do peso de forma gradual e dieta com baixo teor
de gorduras e carboidratos na obesidade, bom controle metabólico na
dislipidemia e diabetes mellitus, interromper o uso de álcool e se o paciente
estiver em terapia nutricional parenteral, reduzir as calorias totais e infusão
de carboidratos, administrar nutrição parenteral de forma cíclica e se possível
administrar nutrição enteral concomitante.
A esteatose hepática pode ser evitada,
assim como suas perigosas consequências. Para isso, é importante seguir uma
dieta adequada, realizar atividades físicas, controlar o peso e o diabetes
(caso tenha a doença), evitar o consumo exagerado de bebidas alcoólicas, não
recorrer a automedicação e realizar exames de saúde preventivos.
As informações contidas neste blog, não devem ser substituídas
por atendimento presencial aos profissionais da área de saúde, como médicos,
nutricionistas, psicólogos, educadores físicos e etc. e sim, utilizadas única e
exclusivamente, para seu conhecimento.
Referências
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Um comentário:
Parabéns, muito bem redigido e esclarecedor seu artigo.
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