segunda-feira, 8 de outubro de 2018

Gases Intestinais


Flatulência, borborigmo, eructação, enfim, os gases, apesar de parte do processo digestivo, são quase sempre incômodos e embaraçosos, porém nem sempre significam um problema de saúde. Os estudos mostram que a pessoa média gera de 0,6 a 1,8 litros de gás por dia. Este gás vem de duas fontes: a maior parte é de ar engolido (exógeno) e o restante é o produto de bactérias do intestino grosso (endógeno). Gases intestinais são compostos por diferentes quantidades de oxigênio, nitrogênio, dióxido de carbono, hidrogênio e metano. Somente 1% dos gases tem odor - as bactérias intestinais produzem diversos compostos contendo enxofre, o culpado pelo cheiro.

Movimento de gases no sistema digestivo

O gás pode ser liberado através da boca (eructação) ou do ânus (flatos). Segundo a Sociedade Canadense de Pesquisa Intestinal, um indivíduo saudável emite flatos de 12 a 25 vezes por dia! Numa situação normal, o ar engolido permanece no estômago por um tempo e então passa através do trato digestivo em pequenas quantidades e a intervalos regulares. Ele se move rapidamente pelo intestino delgado, impulsionado por suas contrações rítmicas (peristalse). Este processo não causa qualquer sintoma desconfortável. Quando o gás chega ao cólon, o ânus o libera gradualmente, e este gás costuma ser inodoro.

O que causa a produção de gases?

Muitos fatores influenciam a passagem de gás, incluindo a quantidade de ar engolido, tipo de alimento, frequência de ingestão, motilidade do intestino (que pode ser afetada por alimentos), hidratação, medicamentos e estresse. Pessoas que se queixam de flatulência podem estar produzindo gases intestinais associados às alterações da microbiota (flora intestinal).  

Sintomas de gases intestinais podem ser intensos             
                                                            
Para muitos, a passagem de gás através do trato digestivo não provoca nenhum sintoma, porém outros reclamam de arrotos frequentes, distensão abdominal, desconforto, dor e grande produção de flatos. As pesquisas mostram que alguns indivíduos, ao beber durante uma refeição, podem engolir duas vezes mais ar do que líquido, especialmente ao usar um canudo. O gás se acumula no estômago, o abdômen estufa dolorosamente e a roupa fica apertada. Como a distensão do trato digestivo afeta as contrações intestinais, o gás passa rapidamente do estômago para o intestino, com aumento do peristaltismo (movimento intestinal) normal, e pode causar cólicas dolorosas.

Gás exógeno

Gás que vem de fora (exógeno): para reduzir esta importante fonte de gases intestinais é necessário engolir menos ar. O que aumenta a ingestão de ar é mastigar chicletes, fumar, engolir alimentos velozmente sem mastigar de forma apropriada, comer tomando líquidos, ingerir bebidas muito quentes, usar canudo. Limitar essas atividades ajuda a reduzir a quantidade de ar engolido. Outros fatores que contribuem são um encaixe dental desalinhado, rinite crônica, dor crônica, ansiedade e tensão.

Gás endógeno

Gás que vem de dentro (endógeno): o cólon abriga muitas bactérias produtoras de gás que fazem a festa com carboidratos ricos em amidos (mal digeridos) e açúcares. O gás malcheiroso se forma quando as bactérias fermentam estes alimentos na sua passagem através do cólon. A fermentação produz bolhas de gás. Alguns alimentos são conhecidos como produtores de gás, dependendo da tolerância individual: feijão, leite, pão, repolho, brócolis, alho, cebola, frutose, alimentos processados, refrigerantes.

Feijão produz gases?

Nem todos têm gases e distensão abdominal com os mesmos alimentos, isto varia para cada indivíduo, porém alguns alimentos são mais problemáticos. Um deles é o feijão, que contêm os carboidratos complexos rafinose e estaquiose. O intestino humano não consegue metabolizar estes carboidratos por conta própria porque não produz as enzimas necessárias para a sua digestão. As bactérias e leveduras que vivem no cólon fazem este trabalho, só que o subproduto do processo é a formação de gases. Para quem tem problema com a digestão do feijão e de outros alimentos como repolho, brócolis e cereais integrais, há suplementos com alfa galactosidase, uma enzima que digere a rafinose e a estaquiose.

Intolerância à lactose

Outro colaborador para a produção de gás é a intolerância à lactose, que afeta cerca de 70% dos adultos em todo o mundo, em diferentes graus. Neste caso, há uma deficiência da enzima lactase, necessária para digerir lactose, o açúcar presente no leite. Um bom teste é tirar o leite e lácteos durante 10 dias, e verificar se os sintomas relacionados com o gás persistem ou cessam. Para os intolerantes à lactose, há suplementos contendo lactase, e também leite e iogurte lacfree, que já vêm adicionados de lactase. 

Sensibilidade ao glúten

O glúten é uma proteína de difícil digestão e pode deixar a barriga inchada logo após a sua ingestão. Isto pode ser um sinal de sensibilidade ou intolerância ao glúten. Um estudo italiano mostrou que 87% das pessoas com suspeita de sensibilidade não-celíaca ao glúten têm distensão abdominal ao consumir alimentos com glúten, como o pão. Além de feijão, lactose e glúten, há frutas, legumes e cereais que podem produzir gás, dependendo da reação individual. 

Gases podem sinalizar distúrbios gastrointestinais

A produção de gases é uma parte natural do processo digestivo. O excesso de gás e alteração no cheiro podem indicar potenciais problemas de saúde. Uma pessoa saudável libera gás entre 12 a 25 vezes por dia e, quando há algum problema digestivo, pode chegar a 50 vezes. Inchaço abdominal por gases é um dos problemas mais comuns em pessoas com distúrbios gastrointestinais. Vários fatores, incluindo modificações da microbiota (flora intestinal), motilidade intestinal alterada, respostas viscerais anormais, dieta inadequada e fatores psicológicos, têm sido sugeridos como possíveis mecanismos de flatulência.

Alterações na flora intestinal e doenças    
            
A formação de gases resulta da atividade metabólica da microbiota intestinal, especialmente no processamento de carboidratos. Alterações na quantidade e na composição dos gases podem sinalizar um desequilíbrio na fisiologia intestinal (disbiose), doenças do aparelho digestivo, processos inflamatórios, redução na produção de enzimas digestivas, má absorção intestinal. Os problemas de saúde que mais causam aumento da flatulência com mau cheiro são má digestão (dispepsia), gastroenterite, intolerância à lactose, má absorção de carboidratos, doença de Crohn e síndrome do intestino irritável.

Dieta adequada

Além da intervenção medicamentosa quando necessário, há recursos terapêuticos que incluem modificação da dieta e modulação da microbiota (administração de bactérias probióticas). Comece eliminando os alimentos produtores de gás (FODMAPs - veja adiante) de acordo com a sensibilidade individual, e dê ênfase a alimentos ricos em pré e probióticos. O uso de enzimas digestivas pode ser de grande ajuda, assim como suplementar lactobacilos e bifidobactérias.

Alimentos FODMAP aumentam a produção de gases  

FODMAP, sigla para Oligossacarídeos, Dissacarídeos, Monossacarídeos e Polióis Fermentáveis, são tipos de açúcares encontrados em uma grande variedade de alimentos,  e podem ser de difícil absorção pelo intestino delgado para algumas pessoas. Mal digeridos, eles vão parar no intestino grosso onde são fermentados por bactérias, produzindo muitos gases e dor. Diversos estudos mostram que os FODMAPs contribuem para os sintomas associados à síndrome do intestino irritável.

Alimentos com alto FODMAP

A lista de alimentos com alto FODMAP é grande, sendo os principais leite (de vaca, cabra ou ovelha), sorvete, iogurte, queijo fresco e cremoso (ricota, cottage, cream cheese); soja e leite de soja; pães, massa, bolos e biscoitos contendo trigo e centeio; cebola, alho, beterraba, brócolis, repolho, couve, alho-poró, quiabo, couve-flor, alcachofra, aspargo; ervilha, grão de bico, feijão, lentilha; maçã, pera, pêssego, manga, melancia, nectarina, cereja, abacate, frutas secas; mel, frutose, xarope de milho, adoçantes manitol, sorbitol, xilitol.



Sensibilidade individual

É importante lembrar que cada pessoa tem a sua sensibilidade particular a algum tipo de carboidrato, seja ele oligo, di ou monossacarídeo. O procedimento consiste em retirar os alimentos ricos em FODMAP por 6 a 8 semanas, e é possível observar uma melhora dos sintomas já na primeira semana. Após a dieta de exclusão, faz-se a reintrodução dos alimentos de forma gradual, para avaliar a tolerância individual.  Esta informação pode ser usada para criar uma dieta personalizada, menos restritiva.

Alimentos com baixo FODMAP

A lista de alimentos com baixo FODMAP é bem generosa: leite e iogurte sem lactose, leite vegetal (de coco, de amêndoas, de arroz), manteiga, queijos curados (cheddar, parmesão, brie, camembert); farinhas, pães, macarrão e biscoitos sem glúten, farinha de milho, farinha de mandioca, farelo de aveia, quinoa, arroz, tapioca; cenoura, aipo, milho, berinjela, pepino, abóbora, abobrinha, alface, tomate, espinafre, batata, batata-doce; banana, abacaxi, melão, kiwi, limão, laranja, tangerina, morango, maracujá, uva, amora, carambola; melado, stévia.

Síndrome do intestino irritável

A síndrome do intestino irritável (SII) é uma condição comum que afeta negativamente a qualidade de vida, com intensa produção de gases causando dor e distensão abdominal. A grande maioria dos pacientes com SII associa seus sintomas com o ato de comer. Numerosos ensaios randomizados e controlados sugerem que a restrição de alimentos com alto FODMAP melhora os sintomas em mais da metade dos portadores de SII. Os dados sugerem que dietas com eliminação de glúten também podem ser benéficas para estes pacientes.

Texto elaborado por: Dra. Tamara Mazaracki.

Título de Especialista em Nutrologia –  Associação Brasileira de Nutrologia;

Membro Titular da ABRAN – Associação Brasileira de Nutrologia;

Pós-graduação em Medicina Ortomolecular, Nutrição Celular e Longevidade – FACIS-IBEHE – Faculdade de Ciências da Saúde de São Paulo e Centro de Ensino Superior de Homeopatia;

Pós-graduação em Medicina Estética – Instituto Brasileiro de Pesquisa e Ensino – IBRAPE.

As informações contidas neste blog, não devem ser substituídas por atendimento presencial aos profissionais da área de saúde, como médicos, nutricionistas, psicólogos, educadores físicos e etc. e sim, utilizadas única e exclusivamente, para seu conhecimento.

Referências Bibliográficas:

*Canadian Society of Intestinal Research – GI Society

*Gut 2014. Anal gas evacuation & colonic microbiota in patients with flatulence: effect of diet.

*American J Gastroenterology 2017. Bloating and Abdominal Distension: Old Misconceptions and Current Knowledge.

*Curr Opin Clin Nutr Metab Care 2012. Intestinal gas: has diet anything to do in the absence of a demonstrable malabsorption state?

*BMC Medicine 2014. An Italian prospective multicenter survey on patients suspected of having non-celiac gluten sensitivity.

*Korean J Gastroenterology 2017. Bloating.

*Eur Rev Med Pharmacol Sciences 2013. Intestinal gas production & gastrointestinal symptoms: from pathogenesis to clinical implication.

*Gastroenterology 2018. Effects of Prebiotics vs a Diet Low in Fodmaps in Patients with Functional Gut Disorder.

*Nutrition In Clinical Practice 2018. Dietary FODMAPs and Gastrointestinal Disease.

*J Human Nutrition & Dietetics 2018. The low FODMAP diet in the management of irritable bowel syndrome: an evidence-based review of FODMAP restriction, reintroduction and personalisation in clinical practice.

*Expert Rev Gastroenterology & Hepatology 2018. The role of diet in the management of irritable bowel syndrome: a focus on FODMAPs.



Nenhum comentário: